Nesta semana, resolvi abordar o assunto “deficiente” físico em concurso público.Recuso-me utilizar a denominação “deficiente”. Apesar de prevista na Constituição da República, leis, atos normativos e editais de concurso, esta expressão é totalmente imprópria para designar um ser humano. Vou utilizar a expressão portador de necessidades especiais.

Esse tema possui uma grande amplitude, por isso vou ser específico e desenvolver o tema sobre o candidato total ou parcialmente cego de um olho e do outro não (visão monocular) em decorrência da sua não reserva de vagas nos processos seletivos públicos.

A importância da matéria se dá com a leitura do artigo 37, VIII, da CR/88, da Lei 7.853/89 e Decreto n.º 3.298/99 (federal). Acrescentando, o Governo Brasileiro assumiu o compromisso, na 43ª Assembléia Mundial de Saúde, por intermédio da Portaria nº 1311/97, em adotar a Classificação Internacional de Doenças (CID).

Importante transcrever o disposto no Decreto 3.298/99 que regulamenta a Lei 7.853/89 em nível federal, a respeito do conceito de deficiência:

“Art. 3º Para os efeitos deste Decreto, considera-se:

I - deficiência - toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; (grifo nosso)

Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:

III - deficiência visual - cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;” (grifo nosso)

Explicando melhor o disposto acima, o candidato deverá necessariamente possuir acuidade visual baixa nos dois olhos e não apenas em um dos mesmos.

Nesse caso, a perícia médica normalmente não considera o candidato monocular como um portador de necessidades especiais, figurando na lista de classificação geral.

Ocorre que as características abordadas no Decreto 3.298/99 não é exaustiva, sob pena de negar inteiramente o acesso ao portador de necessidades especiais ao direito à igualdade de oportunidades na sociedade. Desta maneira, deve-se buscar interpretar as normas a fim de preservar a efetividade desse direito fundamental.

Imprescindível se faz transcrever a posição do Superior Tribunal de Justiça nos acórdãos abaixo:

Administrativo. Concurso Público. Portador de visão monocular. Direito a concorrer às vagas destinadas aos portadores de deficiência física. Recurso Ordinário provido.

O art. 4º, III, do Decreto 3.289, que define as hipóteses de deficiência visual, deve ser interpretado em consonância com o art. 3º do mesmo diploma legal, de modo a não excluir os portadores de visão monocular da disputa às vagas destinadas aos portadores de deficiência física. Precedentes.

Recurso ordinário provido. (RMS nº 19.257 - DF. Ministro Relator Arnaldo Esteves Lima).

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Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Deficiente visual. Visão monocular. Exclusão do benefício da reserva de vaga. Ilegalidade. Recurso provido.

I - A deficiência visual, definida no art. 4, III, do Decreto nº 3298/99, não implica exclusão do benefício da reserva de vaga para candidato com visão monocular.

II - “A visão monocular cria barreiras físicas e psicológicas na disputa de oportunidades no mercado de trabalho, situação esta que o benefício da reserva de vagas tem o objetivo de compensar. (RMS 19.291 - PA. Relator Ministro Felix Fischer).

A não observância do caso acima, cabe, dependendo do caso, a propositura de uma ação anulatória ou mandado de segurança com pedido de liminar para determinar que o candidato seja nomeado e empossado.

Atenciosamente,

Doutor Tiago Queiroz

Advogado e Professor Especializado em Concursos e Servidores Públicos

Avenida Rio Branco, 277, sala 301-F - Edifício São Borja - Centro

Rio de Janeiro - RJ

(21) 2262-4915

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